terça-feira, 1 de outubro de 2013

A batalha do gordo não é só contra a balança

Uma noite comum de diversão com os amigos, uma festa conhecida por todos na cidade, cerveja, música, risada. Tudo nos conformes, do jeito que uma saída jovem deve ser.

Lembro-me que naquele dia eu lutei contra o guarda-roupa. Ele atirava toda sorte de roupas contra o meu corpo, enquanto eu tentava tira-las, quase rasgando, odiando tudo aquilo que queria me cobrir. Não porque eu queria sair despida, muito pelo contrário, mas parecia que o que era feito para me disfarçar ainda mais me evidenciava.

Eu não queria estar naquele lugar. Não sei explicar, mas havia motivos maiores do que simplesmente a trilha sonora sertaneja que eu detesto. Na verdade, naquele dia, eu não queria existir, porque me sentia “existindo demais”. Mas eu dei uma chance. E, céus, quantas chances erradas a gente dá nessa vida…

Uma inocente ida ao banheiro se transformou em um pesadelo. Na volta, rodeada de uns três ou quatro caras, me vi no meio de uma rodinha de pessoas grotescas e asquerosas que tiravam sarro de mim. Aos 24 anos, eu era obrigada a ser ridicularizada por causa do meu peso.

Permitam-me contextualizar. Olá, eu sou a Bianca. Pratico esportes desde os 8 anos de idade, fui da equipe de natação e de vôlei do clube, participei de competições neste último até os 17 anos de idade. Entrei pela primeira vez na vida em uma sala de musculação aos 14 anos e, desde então, nunca mais parei. Ano passado consegui correr os primeiros 6 quilômetros da vida sem parar um segundinho pra pegar um fôlego. 

Mas então, eu tenho 1,68m de altura e peso mais de 80 quilos. Estranho, alguns podem pensar, diante de tantas informações “fitness”. Mais estranho ainda é saber que nunca, nunquinha, eu fui magra. Nem quando nasci.

Sempre fui gorda. Sim, gorda, porque “gordinha” é pejorativo demais. Desde que me lembro de entender o significado do nosso peso na balança eu estou acima do peso ideal para minha idade e tamanho. E desde que me lembro de entender que deveria emagrecer, seja lá por qual motivo fosse, me recordo do quanto perder o excesso de peso é difícil.

Imagem: reprodução
Eu já encarei diversos tipos de métodos emagrecedores. Nutricionista, endocrinologista, dieta normal, dieta maluca, remédio tarja preta, whey protein, exercícios dos mais variados. Já emagreci e engordei em velocidades igualmente proporcionais, mas a maior parte do meu tempo em solo terrestre eu permaneci gorda.

Eu odeio ser gorda. Não condeno a gordura de ninguém, desde que você tenha um mínimo de cuidado com a saúde, mas eu, particularmente, ODEIO ser gorda. Talvez por lembrar dos traumas de infância (todo mundo sabe que criança é cruel e inventa apelidos que até beiram a criatividade de tão sinceros), talvez pelas calças que até hoje cismam em travar nas minhas coxas, talvez porque eu adoro comer uma besteira e me privo delas diariamente. Talvez, mais ainda, porque eu me olho no espelho e tenho vontade de gritar,
xingar, chorar, pra ver se mesmo isso me ajuda a gastar calorias.

Ser gordo não é fácil. É conviver diariamente com os olhares repudiatórios de pessoas que simplesmente acham que você, antes de nascer, preencheu um formulário e marcou lá “quero ser gorda”. É uma luta diária, infindável e dolorosa, se olhar no espelho é quase uma punição. É saber (e ouvir) que um número X de pessoas pensa “nossa, que rosto lindo, podia emagrecer”. Que será que essas pessoas têm na cabeça? 

Eu sou gorda, mas facilmente me enquadro no grupo de pessoas mais ativas que eu conheço, em termos de atividades físicas (e sociais também, por que não?), e minha saúde está totalmente em dia. É o suficiente? Não é né, principalmente quando você ainda vive em uma sociedade que ridiculariza gratuitamente as pessoas que estão fora de um padrão estapafúrdio de beleza, que uma parcela bem pequena pode cumprir (e sim, eu já passei por DIVERSAS situações de constrangimento, além da citada acima, que eu definitivamente não merecia passar).

Admiro as pessoas que se aceitam como são, ainda mais no mundo hipócrita e preconceituoso em que a gente vive. Gordura é doença? É contagioso? Fede? Fere? Por que o ser humano precisa agredir fisicamente, verbalmente, psicologicamente ou até visualmente o que foge ao seu próprio padrão?

Aceitação é pessoal e intransferível, e ninguém, sob hipótese alguma, pode ferir o que é seu por direito. Diferente de mim, existem gordos nas mesmas condições de vida e saúde que se amam como são e vivem bem. São felizes, têm emprego e vida social, tiram fotos, e olha só, para espanto daqueles que me ridicularizaram, até namoram! Pelados, quando a situação exige. E gostam bastante de namorar.

Não vou entrar no mérito dos esforços que cada um pode fazer por si mesmo, física e psicologicamente falando, porque eu mesma sei dos trilhares de esforços que faço por mim, mas deixo um apelo para que as pessoas entendam que ser gordo é MUITO difícil, e que nem sempre é somente por falta de força de vontade. Somos bombardeados por informações que praticamente nos obrigam a ter corpos esguios e nem todos têm força, ou personalidade, ou vontade, ou seja lá o que for para bater no peito e dizer “eu sou como sou, e não como você quer que eu seja”.

Ah, sobre minha vida? Ela não para não. Nunca parou, e eu nunca pensei em desistir. Já tive períodos de maior disciplina e outros de maior preguiça, mas continuo na batalha. Magra? Não, isso eu sei que nunca vou ser. Mas talvez, no meio de tanto exercício, meu próprio cérebro fique mais forte e entenda que isto é o corpo que me foi dado, e isto é o que deve ser amado.

Eu chego lá. 

(Esse texto foi inspirado por este outro aqui: http://www.cartacapital.com.br/blogs/feminismo-pra-que/deixem-as-gordas-em-paz-9363.html)

** Post colaborativo criado para o blog Bendita Versão **

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